sexta-feira, 22 de julho de 2016

RIO, Maria do Céu

Exemplo dos Lavores femininos
Haverá ainda hoje certamente muitas senhoras farenses que se recordam de Dª Maria do Céu Rio, uma prestigiada professora de Lavores Femininos, que ensinou a muitas jovens meninas os primeiros rudimentos das artes manuais, e da educação feminina, especialmente das chamadas artes menores. Mas os principais aspectos desse tipo de ensino prendiam-se com a chamada educação feminina, relacionadas com actividades domésticas, como bordar, costurar, passajar, remendar e até reciclar roupa usada, mas também pintar, modelar o barro, fazer tapeçarias, e até cozinhar. Noções de higiene, de puerícia e de civilidade, eram igualmente veiculadas às jovens alunas. 
Esta conceituada professora de Lavores e de Educação Feminina não nasceu no Algarve, mas isso não obstou a que fosse considerada, nos anos quarenta e cinquenta do século XX, como uma das mais apreciadas e respeitadas professoras do Ensino Técnico Profissional no Algarve. 
Maria do Céu Rio, nasceu em Lisboa no ano de 1890, e fez toda a sua formação escolar e profissional na capital, onde viria a conhecer o seu marido, José Fernandes Guerreiro, algarvio que julgo nascido em Loulé, também professor-mestre na área do Ensino Técnico-Profissional.
Por razões de facilidade de colocação profissional, e também por conveniência conjugal, decidiram ambos concorrer à Escola Industrial e Comercial de Faro, em cujo quadro docente foram integrados, na qualidade de mestres nas suas áreas de especialização, ela nos Lavores e ele no Desenho Industrial e Oficinas. Ambos adquiriram rapidamente uma certa aura de competência e de prestígio profissional, que lhes foi conferida pelos colegas, mas principalmente pelos alunos, que reconheciam na Profª Maria do Céu uma forte veia artística e uma apetência natural para o desenho, para a pintura, e muito especialmente para os bordados e tapeçarias. Por outro lado, era uma senhora muito simpática, de boa educação, porte fino e lanheza de trato. Mostrava-se sempre condoída com a infelicidade alheia, com os pobres e as agruras dos necessitados, participando com o seu esforço e os seus lavores artísticos na angariação de meios para acudir às crianças desvalidas e às famílias mais desfavorecidas. Era em tudo um coração terno, de espírito solidário e benfazejo.
Um lenço bordado na aula de Lavores
Ao longo da sua vida dedicou-se ao estudo das artes tradicionais portugueses, particularmente na área da tapeçaria, aprendendo as técnicas mais exigentes, não só de Portalegre como também de Arraiolos, inclusivamente os bordados de Castelo Branco, e outras técnicas mais populares mas menos exigentes.
Mercê da sua disponibilidade e espírito cooperante, mas também pelo seu talento artístico e grande aptidão para o restauro de obras de arte, foi-lhe pedido que efectuasse o restauro das tapeçarias de Tavira existentes no Museu da Figueira da Foz, o que fez com que se dedicasse ao estudo dos tapetes tradicionais franceses executados na conformidade das técnicas de Aubusson.
Trabalhou na Escola Industrial e Comercial de Faro durante mais de trinta anos, até à aposentação por limite de idade, granjeando provas da maior admiração e simpatia por parte dos seus colegas, alunas e funcionários, que não regateavam elogios aos seus gestos de bondade e de generosidade, mas também às provas da sua elevada competência profissional.
Faleceu a 25 de Setembro de 1974, quando tinha 74 anos de idade, e toda a sociedade farense sentiu com extremo pezar o seu desaparecimento. A Escola Industrial e Comercial de Faro deu a público um voto de luto pelo falecimento da Profª Maria do Céu Rio, cujo inconsolável marido ainda continuava ligado àquela instituição de ensino.

sábado, 9 de julho de 2016

ASCENSÃO, Coronel Rodrigo António d’Aboim

Casal Aboim Ascensão, 
 como  filho Rodrigo
Militar e político, nasceu em Faro, a 23-8-1859, e faleceu com 70 anos de idade em Lisboa, a 22-1-1930. Era filho de Manuel Joaquim Ascensão e de D.ª Maria da Piedade de Mascarenhas Aboim, oriunda de uma das mais ricas e prestigiadas famílias do Algarve.
Possuía um primoroso carácter e uma inexcedível bondade, sempre muito preocupado com os mais desfavorecidos e, sobretudo, com o combate à pobreza, nunca se alheando do progresso da sua terra natal e do Algarve em geral, razão pela qual era muito estimado e admirado pelos seus conterrâneos.
Cor. Rodrigo Ascensão
O coronel Aboim Ascensão foi um militar prestigiadíssimo, que realizou com alta distinção o curso do Colégio Militar, seguindo depois para a Escola do Exército, onde cursou com alto aproveitamento a arma de cavalaria, na qual se manteve com enorme competência e muita paixão até ao fim da vida. No exercício das suas competências militares serviu durante muitos anos na Guarda Fiscal, nas patentes de tenente e capitão sendo depois promovido a 2.º comandante da Circunscrição do Sul. Serviu como capitão ajudante o general visconde de S. Januário, figura de proa do Exército durante a monarquia. Aliás foi durante o anterior regime que o cor. Aboim Ascensão adquiriu grande influência política, não só em Faro, como também em Lisboa. Isso valeu-lhe a nomeação para Governador Civil do Funchal, onde desempenhou as suas funções com acerto e agrado dos interesses madeirenses.
busto em Lisboa
Na sua dedicação filantrópica e benemerente registe-se a sua acção como fundador, em 1901, da Associação Protectora da Primeira Infância de Lisboa, da qual era presidente honorário.
O cor. Aboim Ascensão possuía várias condecorações e mercês honoríficas, de entre as quais distinguimos a de comportamento exemplar e as comendas de Santiago da Espada, de S. Bento, de Aviz e de Mérito Militar Espanhol.
Deixou em testamento vários donativos com os quais contemplou diversos estabelecimentos de assistência, nomeadamente a Associação Protectora da Primeira Infância de Lisboa, a Associação de Beneficência e Instrução do Campo Grande e o Asilo de D. Pedro. Por outro lado, deixou um importante legado para a criação em Faro de uma casa de caridade, para recolha de velhos e crianças desamparadas que se denominaria por «Refúgio Aboim Ascensão». Com efeito, em 1933, o seu sobrinho e genro, Manuel Aboim Ascensão de Sande Lemos (1), no seguimento da referrida vontade testamentária, instituiu o «Refugio Aboim Ascensão», que primeiramente funcionou como lactário (2) e centro de apoio a mães solteiras, evoluindo depois para a prestação de serviços médicos às crianças recém-nascidas e bebés prematuros. O espírito que desde a sua fundação sempre presidiu a esta instituição foi o do nobre sentimento de apoio à primeira infância, espírito que ainda subsiste, cada vez com maior acuidade e sucesso mercê da dedicação e proficiência do Dr. Luís Villas Boas que em 1985 a resgatou do abatimento e ruína em que se encotrava.
Monumento em Faro ao cor. A.Ascensão 
Na verdade tive a infeliz experiência de constatar, nos anos setenta e oitenta, o estado de degradação e de descrédito em que se deixara submergir aquela benemérita instituição. Era visível a falta de asseio e pobreza dos seus internados, que pela manhã se espalhavam pelas ruas da baixa farense, de cabeça rapada e roupa andrajosa, pedindo esmola para comer uma sopa. Isto era identificativo da forma pouco correcta como as crianças estavam a ser tratadas, não sendo despiciendo suspeitar que essas crianças pudessem ter sofrido abusos de toda a espécie. Felizmente, em 1 de Agosto de 1985, o Dr. Luís Villa-Boas, também ele um militar de prestígio e de elevada integridade moral, tomou conta da instituição, estabelecendo depois diversos acordos de cooperação com os Ministérios da Segurança Social, da Justiça, da Saúde e da Educação, e muito especialmente com a Câmara Municipal de Faro, que desde a sua fundação tem prestado um inestimável apoio ao Refúgio. A coordenação de todos esses esforços deu origem ao grande Centro de Acolhimento Temporário de Emergência, vulgo «Emergência Infantil», o primeiro a ser criado no país, para crianças recém-nascidas, dos 0 aos 6 anos de idade, sendo certo que algumas delas permanecem para além dessa idade conforme a especificidade dos casos.
O coronel Rodrigo Ascensão foi casado com D. Olímpia Covachi d'Arrábida Lamas Aboim Ascensão, de quem tinha uma única filha, D. Maria da Piedade Lamas de Aboim Ascensão de Sande e Lemos, casada com o Eng.º Manuel de Aboim Ascensão de Sande Lemos, instituidor, como disse, do «Refúgio». Era irmão de D. Joaquina d’Ascensão Davim, casado com o Dr. Rodrigues Davim, e de D. Maria da Piedade Aboim d’Ascensão, casada com o cor. Sande Lemos. Desta radícula social descendem as mais notáveis e lutocráticas famílias da cidade de Faro.

(1) Manuel Aboim de Ascensão Sande Lemos, nasceu em Faro, a 4-7-1899, e faleceu em Lisboa, a 16-5-2001. Seguiu a carreira militar, na senda dos seus ascendentes, tendo sido um dos oficiais do C.E.P (Corpo Expedicionário Português) condecorados na I Guerra Mundial, por actos de coragem e valentia. Entre outros cargos de prestígio militar, social, cultural e político, merecem particular referência os seguintes: Presidente da Cruz Vermelha Portuguesa. Presidente do Conselho Supremo da Sociedade Histórica de Independência de Portugal. Presidente do Conselho Supremo da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar. Secretário-Director da Associação Protectora da Primeira Infância. Fundador da Ordem dos Engenheiros. Fundador da Caixa de Previdência dos Engenheiros. Fundador da Associação de Beneficência Refúgio Aboim Ascenção. Fundador da Obra Social da Guarda Fiscal. Membro n.º 31 Emérito da Academia de Engenharia. Posterior a 22 de Mar de 1996. Membro n. 31 Emérito da Academia de Engenharia.

(2) O lactário (adaptação do francês crêche) destinava-se a combater a mortalidade infantil, divulgando às mães conhecimentos de puerícia, higiene e alimentação. Por isso, os lactários ficavam perto de maternidades, hospitais, infantários, e outras instituições de saúde materno-infantil, que garantiam alimentação adequada não só aos bébés como também às mães que amamentavam. No fundo os lactários funcionavam como cantinas para crianças pobres, mas também como escolas para jovens mães.