sexta-feira, 29 de maio de 2015

A Rua de Santo António, em Faro

Rua de St.º António, em 1913
No século XX, sobretudo após a I Guerra Mundial, o centro nevrálgico da cidade de Faro, isto é, o eixo económico urbano, deslocou-se para a zona ribeirinha da comummente designada "baixa de Faro", tendo como palco a nova Rua de Santo António para a qual se transferiram as actividades culturais e o convívio social da burguesia farense.
Na verdade, a Rua de Santo António é a expressão viva de uma nova era - o liberalismo, traduzindo em si mesma os efeitos do reordenamento socioeconómico no urbanismo das cidades. Na verdade, ela reflecte a perpendicularidade social e a fluidez económica do novo regime, cuja praxis política se consubstanciava na democracia. Se analisarmos a urdidura socioeconómica dessa rua, vemos que ali se concentraram as instituições orgânicas do capitalismo (banca, seguros, câmbios e até a bolsa clandestina do Aliança), a par dos clubes de elite e do comércio selectivo (ourivesarias, lojas de vestuário parisiense e londrino, livrarias, sapatarias, chapelarias), a que devemos acrescentar os locais de convívio sociocultural: cafés, salões de chã, teatro e cinema.
A Rua de Santo António era o espelho da modernidade e do progresso. Mas, para os mais antigos, ela era apenas a continuação da mui antiga e tradicional Rua do Rego [actual Rua D. Francisco Gomes do Avelar],, que existia na baixa da cidade desde os longínquos tempos medievais. Os limites da cidade terminavam nessa época praticamente na chamada Horta da Mouraria [entre a actual ourivesaria Miranda e a pontinha que atravessava a ribeira que desembocava na Alagoa], que fechava a antiga Rua do Rego, cuja orientação aponta para na direcção da colina fronteira à cidade, no sopé da qual corre a estrada de Olhão, e em cujo alto se erigiu a ermida de St.º António.
Drogaria Pinto, actual loja de Modas Sayonara, em Faro 
Quando nos meados do século XIX a autarquia decidiu esventrar ao meio a Horta da Mouraria, para abrir uma nova artéria a régua e esquadro, não havia então um nome para se lhe atribuir, ficando sob o baptismo popular de "Rua a Santo António do Alto". Mas, quando em 1895 se comemorou a nível nacional o Centenário de Santo António, a autarquia decidiu homenagear o grande taumaturgo nacional, atribuindo-lhe o nome à artéria mais moderna da cidade, onde já estavam a concentrar-se algumas importantes empresas comerciais e casas de câmbios. A notoriedade da nova rua tornara-se visível a partir do último quartel do séc. XIX, quando algumas famílias da nobreza e da alta burguesia começaram a construir as suas residências na popular Rua a Santo António do Alto, designação pela qual era popularmente conhecida.
Entre as famílias que decidiram assentar arraiais na nova rua, destacava-se a dos Pantojas, a dos Carvalhal de Vasconcelos, e outros. As suas residências nobres, quase apalaçadas, de imponente traço arquitectónico, ainda hoje se distinguem na volumetria original da rua de Stº António.
Rua do Rego, actual D. Francisco Gomes, em Faro
A antiga Horta da Mouraria ocupava quase metade da rua, e, mais ou menos no sítio onde ficava a casa dos rendeiros agrícolas, se encontra hoje todo o complexo arquitectónico do Cine-Teatro Farense.
A Rua de Santo António adquiriu grande notoriedade e indisfarçável proeminência a partir dos finais da década de quarenta do século passado, quando o comércio e as filiais bancárias se transferiram da antiga Rua Direita (actual Rua Manuel Bivar) para a Rua de Santo António. Devido à abertura da nova entrada na cidade, através da actual Rua Teófilo da Trindade, o trânsito automóvel passou a orientar-se na direcção da baixa da cidade, confluindo na Rua de Santo António, como centro nevrálgico da actividade económica da cidade.
Mais tarde, nos anos setenta, a rua de Santo António seria encerrada ao trânsito, cobrindo o seu piso de calçada portuguesa e convertendo o seu traçado original num espaço de circulação pedonal. Foi um sucesso para as actividades mercantis da cidade praticamente até ao encerramento do século XX.
Presentemente, devido ao pagamento de estacionamento na baixa da cidade, assim como à construção fora da cidade de um enorme centro comercial (Fórum Algarve), moderno e espaçoso, onde se pode encontrar diversos tipos de actividades mercantis, e mesmo lúdicas, a Rua de Santo António, assim como a generalidade da cidade, perdeu o seu atractivo natural de espaço de convívio e de referência na vida quotidiana dos cidadãos farenses.

quinta-feira, 28 de maio de 2015

Algarve, Serro do

José Joaquim Nunes
Existe um pequeno monte, acidente geográfico que nesta região costuma denominar-se como "Serro", situado a nordeste da aldeia de Mexilhoeira Grande, concelho de Portimão, da qual dista cerca de 4 km, o qual vem registado nas cartas militares com a curiosa designação de «Serro do Algarve». No sopé do referido Serro corre uma ribeira denominada da "Mulher Morta", a mesma que serviu de enquadramento à novela de Manuel Teixeira Gomes intitulada «O Sítio da Mulher Morta». 
Parece um contrassenso, ou falta de imaginação, atribuir-se-lhe tal designação, mas julgo que se deve ao facto do mesmo se encontrar nas imediações do concelho, numa zona mais elevada, integrada no sistema vulgarmente designado por serra algarvia.
No chamado "Serro do Algarve" encontra-se uma gruta de formação calcária, que nos finais do séc. XIX, suscitou a curiosidade da juventude ilustrada, atraída pelas recentes descobertas arqueológicas nas cidades romanas de Pompeia e Herculano, soterradas pelas cinzas do Vesúvio.
Um dos exploradores dessa gruta foi o Dr. José Joaquim Nunes (1859-1932), um dos conceituados vultos da intelectualidade algarvia, natural de Vila Nova de Portimão, que foi sacerdote até à implantação da República, abraçando depois a carreira docente, primeiro no ensino liceal e no Colégio Militar, depois na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Do resultado das suas explorações na Gruta do Serro do Algarve publicou o Dr. José Joaquim Nunes, um curioso ensaio no «Archeologo Portugues» 1ª série, vol. III, 1897, pp. 95-96, do qual deixamos aqui o respectivo para consulta dos possíveis interessados.
http://www.patrimoniocultural.pt/static/data/publicacoes/o_arqueologo_portugues/serie_1/volume_3/95_grutas_algarve.pdf

Barbosa, Teresa da Silva Fernandes Dias

Esta ilustre senhora, que residia nos arredores da cidade de Braga, descendia de importantes e muito respeitáveis famílias, oriundas das melhores linhagens da fidalguia minhota. Os seus vultados bens de fortuna foram-se esvaecendo com o decorrer dos tempos, agravando-se com o advento da República. Sei que era senhora educada e muito respeitada, sendo presença assídua nas acções de benemerência social e nos eventos religiosos da diocese bracarense. A única referência de interesse para este blogue é o facto de ter sido a mãe de D.ª Maria das Dores Dias Barbosa, que após casar com o pintor Carlos Augusto Lyster Franco, ao tempo professor do Liceu Nacional de Faro, veio residir na capital do Algarve, em casa fronteira ao largo de São Francisco, onde nasceu o seu único filho, Mário Lyster Franco, que viria a ser um notável jornalística, escritor e causídico.
Lembro que o pintor Lyster Franco era natural de Belém, nessa altura um concelho autónoma que ainda não se havia integrado em Lisboa. Casou com uma senhora de Braga, e o filho de ambos foi talvez o mais proeminente e genuíno algarvio de todos os tempos.
Para terminar esta breve nota de interesse regionalista, resta-me acrescentar que Dª Teresa Dias Barbosa, faleceu no dia 7 de Junho de 1932, ignorando, porém, que idade possuía aquando do seu passamento.