quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Maria Francisca da Silva Pinto Ribeiro

Conheci esta senhora de algumas visitas que fiz a sua casa na companhia do Prof. Gomes Guerreiro, que nessa altura se deslocava esporadicamente a Faro em missão de trabalho. Estávamos no início dos anos oitenta e nessa altura fazia as primeiras demarches com vista à instalação da Universidade do Algarve, recém criada em 1979. Foi ele, aliás, quem me convidou para leccionar na Universidade do Algarve, em Março de 1983. Até hoje. Já lá vão quase 32 anos.
A Maria Francisca era natural de Faro e residia numa daquelas ruas paralelas à Igreja de S. Francisco que davam acesso ao histórico celeiro do mesmo nome. No enfiamento dessa rua morara também, nos anos 40-50, o poeta António Ramos Rosa, na companhia de seus pais. A razão de eu ter conhecido a Maria Francisca deveu-se ao facto de ser irmã da Dr.ª Julieta da Silva Pinto Ribeiro, minha saudosa amiga, esposa do Prof. Manuel Gomes Guerreiro, reitor da Universidade do Algarve. Quando este vinha a Faro, ainda na fase de instalação da nossa Universidade, costumava ficar alojado na casa da cunhada. Em 1983, o Prof. Gomes Guerreiro fixou residência em Faro, mas todas as semanas ia com a esposa jantar a casa da cunhada.
Era uma senhora muito simpática, alegre e inteligente, que tinha sempre algo interessante para contar sobre os costumes e tradições das gentes algarvias, sobretudo das aldeias serrenhas. Das conversas que tivemos deu para perceber que se sentia muito orgulhosa das suas origens e do progresso da sua cidade natal. Tinhas expressões muito curiosas, próprias do regionalismo algarvio, e sabia muitas histórias sobre a ardilosa mentalidade das gentes da serra. Não confundir com os que vinham das aldeias ou do campo até à cidade de Faro, vender as suas produções agrícolas, ou cuidar das suas vidas, porque a esses costumavam chamar "montanheiros". Por outro lado, a Maria Francisca, conhecera muita gente de que se recordava ao pormenor. Das nossas conversas colhi sempre bons informes, nomeadamente sobre a família Ramos Rosa.
Além da Drª. Julieta da Silva Pinto Ribeiro, tinha mais dois irmãos: Maria Rosa Pinto Ribeiro, que foi chefe dos CTT em Messines, casada com Justino das Neves Mascarenhas, funcionário da Caixa Geral de Depósitos, em Portimão; e Fernando Pinto Ribeiro, quadro dirigente do Hotel Tivoli, em Lisboa, casado com Maria José Pinto Ribeiro.
A Maria Francisca da Silva Pinto Ribeiro não foi propriamente uma mulher notável, com uma vida preenchida por actividades sociais dignas de relevo. Foi uma simples cidadã que me honrou com a sua amizade. E isso me basta para aqui a relembrar com muita saudade.

Faleceu precocemente em Lisboa, com apenas 59 anos de idade, em Abril de 1985.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Maria Isabel de Roldan Ramirez

Foi uma das senhoras mais distintas da sociedade algarvia do seu tempo. Era natural Vila Real de Santo António e veio a falecer em Lisboa, com 85 anos de idade, em meados de Março de 1983.
Na sua juventude foi uma das mais belas jovens da foz do Guadiana, educada e inteligente, de espírito muito alegre, sempre disposta a colaborar nas manifestações de carácter religioso, cultural e associativo, sobretudo quando tivessem por objectivo a solidariedade social.
O facto de ter sido casada com o eng.º Sebastião Garcia Ramirez, figura muito respeitada no Algarve, que foi ministro e deputado no antigo regime, permitiu-lhe dedicar-se a obras sociais de protecção dos desvalidos e de auxílio aos mais desfavorecidos. Na capital participou em várias actividades de solidariedade social e de protecção das mulheres, tanto na doença, como na formação profissional, na puerícia, na higiene e no conforto familiar. Fez uma vida a pensar nos outros, sobretudo nas crianças que dependiam de cuidados especiais, angariando fundos e outros meios para auxiliar na educação e na saúde dos mais desprotegidos.

Creio que tinha uma única irmã, a sr.ª D.ª Valentina Roldan Dourado, de cuja descendência sei muito pouco. Era cunhada de D. Maria del Carmen Sanches Ramirez, e de D. Maria Emília Ramirez Sanches, que foi casada com o eng.º Francisco Ortigão Sanches.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

As Origens e Desenvolvimento do Ensino em Faro

São intrinsecamente religiosas as origens do ensino em Portugal. E se nos primeiros tempos cabia aos Dominicanos, Beneditinos, Agostinianos a missão de educar, a partir de meados do século XVI o ensino tornara-se praticamente monopólio dos inacianos. A reforma Pombalina do ensino constitui a pedra basilar do nosso sistema educativo. Essa reforma atribuía a todas as cidades e vilas do reino uma escola de «aprender a ler, escrever e contar». Em 1836, Manuel da Silva Passos, procedeu ao reordenamento educativo, criando os Liceus Nacionais, as Escolas Médico-Cirúgicas, as Escolas Politécnica de Lisboa e do Porto, o Conservatório de Arte Dramática, as Academias de Belas Artes de Lisboa e do Porto, a Escola do Exército, etc. Nunca se tinha ido tão longe numa reforma educativa.

Em 1849 abriu portas o Liceu de Faro. Daí por diante, assiste-se à fundação das escolas de Desenho Industrial Pedro Nunes, a Escola Primária Superior, a Escola Normal Superior, a Escola Comercial e Industrial Tomás Cabreira, o Magistério Primário, a Escola de Hotelaria e Turismo, o Instituto Politécnico e a Universidade do Algarve.

Museu Antonio de Faro, e o turismo no Algarve

No contexto museológico da cidade de Faro assume particular interesse o Museu Antonino, que, reunindo características populares, perpectualiza justamente a memória de um dos mais antigos padroeiros desta cidade: Santo António. A ermida de Stº António do Alto, onde se acha inserido o Museu, situa-se na mais alta colina da cidade, que em tempos idos foi uma primitiva torre de vigia da costa (as conhecidas atalaias), que para contrariarem as constantes investidas dos corsários árabes davam o sinal de rebate chamando as populações a defenderem os seus haveres. Igualmente ali se verificaram sangrentas lutas, durante a guerra civil de 1832-1834, pela posse do mais estratégico ponto militar da cidade, facto esse que era há anos facilmente constatável pelos buracos das balas incrustadas nas paredes do edifício, mas que, infelizmente, são hoje irreconhecíveis devido aos trabalhos de reboco e restauro mandados executar pela edilidade.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

O Museu e a Escola

O museu é, no seu próprio contexto geográfico, o mais valioso espólio do património local. Nele se deposita a memória dos nossos antepassados e através dele poderemos fazer uma verdadeira e alucinante viagem no tempo. Aí se contacta com testemunhos insubstituíveis cuja observação e estudo nos farão compreender melhor a nossa história. Porém, há que preparar convenientemente essa visita para que não nos confrontemos com situações ou peças museológicas que nada nos dizem por lhes desconhecermos o significado. Não vale a pena levar as crianças a visitar uma praça-forte sem terem previamente uma noção do que foi e em que consistiu o feudalismo.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

CAPA, Encarnação Piloto

Senhora de excelsas qualidades humanas, natural de Vila Real de St.º António, onde viria a falecer nos princípios de Agosto de 1965, com a provecta idade de 90 anos. Descendia de uma prestigiada família local, de grandes tradições mercantis na faixa raiana do Guadiana, desde a cidade de Beja até à Vila Pombalina, que marcou vincado relevo na vida económica algarvia dos princípios do século vinte. Mercê da sua bondade e dedicação aos mais desfavorecidos deixou viva saudade não só nos que a conheceram como sobretudo nos seus honrados e orgulhosos descendentes.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

COMO SE FAZ UMA RECENSÃO CRÍTICA

Uma recensão crítica é uma avaliação e como tal deve ser operada com rigor e isenção, unicamente por especialistas na matéria cuja apreciação deve ser chancelada por uma instituição científica, para que a mesma possa ter credibilidade e ser objecto de referência. O recensor (passo o neologismo) é um ser crítico, que deve pugnar pelo progresso da ciência e do conhecimento, através do seu distanciamento da obra e do autor, fazendo da isenção e da objectividade a sua bandeira e o seu lema de trabalho. Basta estes dois atributos para que a sua recensão possa ser credível e respeitada.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Opus Latericium - Termos técnicos de construção civil romana no Algarve (2)


No anterior spot sobre o "Diamicton" referi-me, de passagem e sem grandes pormenores, ao "Later". Pois bem, agora vou acrescentar mais alguma coisa, não muito para não maçar os meus leitores.
Tijolo com marca de oleiro, das ruínas de Milreu
O "later" é, em suma, um vulgar tijolo de barro, que, quando menos espesso e grosseiro, pode também chamar-se ladrilho. Neste caso servia para cobrir o chão das casas, as paredes exteriores e até os arcos das abóbadas de berço, de canudo ou de meio canhão, tão características da arquitectura romana. Os tijolos romanos diferenciam-se dos de hoje pela sua forma densa, compacta e alongada.
Existem várias denominações para o tijolo romano (later), conforme a sua cozedura e tipo de fabrico. Assim, classifica-se como "later crudus" o tijolo rudimentar, feito à mão em barro cru, que é cozido ao sol. Era algo semelhante ao tijolo adubino, que remonta ao Antigo Egipto, e que ainda hoje se usa nas construções em taipa e adobe, muito comum na zona do Magreb. Mais perfeito e exigente, na sua composição e moldagem, por ser cozido em forno, é o "later coctus", por vezes nomeado somente por "coctilis".
Logicamente obedeciam a vários formatos e feitios, e por isso eram autenticados pelo próprio fabricante, que neles gravava o seu nome ou o da olaria. Aliás isso é perfeitamente visível nos vários e diferenciados "lateres" que foram encontrados no Milreu, e se encontram actualmente depositados no Museu Arqueológico e Lapidar Infante D. Henrique, em Faro.
A oficina ou olaria onde eram fabricados os tijolos de barro chamavam-se "lateraria", e em Ossónoba, actual Faro, existiram várias.
"Laterculus" era a designação que se dava aos tijolos e ladrilhos de pequenas dimensões, o que, por extensão, passou a chamar-se também a qualquer objecto de barro que tivesse o mesmo feitio. Por isso, há que ter cuidado e muita atenção, porque os arqueólogos, nomeadamente os italianos, usam a classificação "laterculus" para todos os pedacinhos de barro que, sem saberem do que se trata, registam nos seus espólios e até nos inventários dos museus.
trecho de parede construída em "opus latericium",
Por "Latericius" designava-se tudo aquilo que fosse construído com tijolos de barro grosseiro ou com ladrilhos de fraca qualidade. O chamado "opus latericium" é o aparelho de construção usado pelos romanos para encher as cofragens das paredes dos edifícios. Não esqueçamos que alguns dos edifícios e monumentos da Roma antiga tinham vários andares, e até as populares "insulae", onde residia o povo miúdo da cidade, eram erigidas em tijolo e madeira de fraca qualidade, mas não ruíram senão às mãos dos bárbaros. As técnicas de construção dos romanos eram fiáveis e muito avançadas para o seu tempo, recorrendo muitas vezes à cal hidráulica, uma técnica que levamos quase mil anos para descobrir como se fazia.

Em "opus latericium" é construída uma parte do edifício designado por templum que se encontra nas ruínas do Milreu.

domingo, 11 de maio de 2014

LÁBDANO, a resina da esteva


A flor da Esteva
   Designa-se por Lábdano ou Ládano a planta silvestre, muito vulgar por entre os matos do sul peninsular, conhecida por Esteva. A sua designação científica, cistus ladanifer, deriva precisamente do lábdano, que é o óleo resinoso que cobre as folhas verde escuras da planta. Quem já andou pelas matas algarvias por certo já colheu a flor da esteva, seduzido pelo aroma da sua resina, que supunha ser o perfume da flor. Embora seja uma planta silvestre, a esteva é de uma beleza ímpar e sedutora. Apresenta-se em forma de arbusto, com mais de um metro de altura, e tem uma flor grande de uma brancura imaculada. Possui cinco pétalas muito finas, com uma pinta bordeaux em forma de ponta de lança. Ao centro os estames amarelos cintilantes parecem uma coroa de fios de de ovos. Há quem lhe atribua propriedade medicinais únicas. Em chã é muito recomendado o chã das flores para o colesterol e a rama para o combate ao ácido úrico. Muitas outras propriedades lhe são atribuídas, que não vem agora e aqui ao assunto.
   Uma das suas utilidades, depois de seco o arbusto, é como combustível natural. Antigamente, nos campos algarvios, cozinhava-se com o fogo da esteva, pois que sendo uma planta lenhosa e resinosa transforma-se facilmente num combustível de fácil incineração. A chama do fogo da esteva é muito luminosa e incandescente, mas dura pouco, porque a planta-se consome-se rapidamente. Por isso é muito boa para acender o fogo das actuais lareiras, funcionando como uma espécie de acendalha natural. Quando no verão as florestas ardem por esse país fora, a esteva é o maior inimigo dos bombeiros.
   Mas o mais importante da esteva é o Lábdano, essa natural exsudação resinosa e aromática que ressuma das suas folhas, muito empregue na indústria da perfumaria, e actualmente também na farmacologia. A forma como era capturada antigamente constitui o cerne deste apontamento. O método era rudimentar, mas creio que ainda hoje não se conhece outro. Fazia-se do seguinte modo: dois homens seguravam nas pontas de uma corda de crina (feita geralmente com a lã da ovelha) e passavam-na meticulosamente por cima das estevas para capturar a resina. Havia também quem improvisasse atando cordéis a um pau curto e com ele se sacode todas as manhãs as plantas, enquanto estão cheias de orvalho. O método mais rudimentar era o dos pastores, que levando os seus rebanhos para os matos das estevas, costumavam ao fim do dia pentear pacientemente a lã do pescoço e do dorso dos animais, para dela extrair a resina. Apanhada a resina tratava-se depois de a derreter em lume brando até que por fim se deixava coalhar.
   A principal utilização industrial da resina da esteva é na preparação da perfumaria, onde é empregue como fixador. Por isso, no século passado houve um indivíduo francês que passando pelo Algarve verificou que a esteva era uma espécie de praga natural que se desenvolvia sem custos nem trabalhos. Logo fez divulgar pela imprensa regional que iria aqui fundar uma fábrica de perfumes. O caso subiu às instâncias superiores que acolheram a ideia com júbilo. Só havia um pequeno pormenor: o indivíduo não tinha capital para fundar a indústria, mas tinha o saber especializado para extrair a resina e começar a produzir perfumes no Algarve. É claro que se fosse hoje o homem estava garantido. Mas, naquela altura, o governo mandou-o primeiro arranjar o capital junto dos investidores do país dele, e só depois é que estaria disposto a recebê-lo para se pensar nessa tal indústria dos perfumes do Algarve.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

DIAMICTON - Termos técnicos de construção civil romana no Algarve


Edifício do Templum de Milreu
O diamicton consiste na forma de aparelho usada pelos construtores romanos nas paredes e muros dos edifícios que encontramos em diversas estações arqueológicas no Algarve, como por exemplo em Milreu.
As superfícies exteriores dos edifícios romanos eram feitas em pedra ou cobertas de ladrilho, mas o centro, isto é o grosso da parede, era preenchido com pequenas pedras e argamassa. É esta a forma de construção que se encontra nas ruínas do Milreu. Aí o revestimento exterior é em "later", ou seja o conhecido "opus latericium" muito comum no sul peninsular, enquanto o revestimento interior é uma espécie de alvenaria grosseira.
O "diamicton" diferencia-se do "emplecton" porque este tinha a mais o chamado "diactoni", isto é, uma espécie de pedra talhada que de espaço a espaço atravessava toda a espessura da parede, contribuindo para a sua solidez.
Panorâmica da estação arqueológica da Villa do Milreu
Ver outras formas de construção de paredes romanas nas minhas fichas sobre "Caementicia" e "Isodonum".
Como nota curiosa acrescentarei que era também o "diamicton" o sistema de construção empregado no "balineum" luso-romano descoberto em S. Vicente do Pinheiro (ver crítica a um trabalho sobre o assunto publicado no «Arqueólogo Português», vol. VIII, p. 167)
Ao "diatoni", atrás referido, e característico do "emplecton" chama-se na crítica "junteiros".