sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Filipe Viegas Aleixo, um revolucionário de cuja memória o Algarve se orgulha

J. C. Vilhena Mesquita

Reputado activista sindical e lutador antifascista, Filipe Viegas Aleixo foi também um conceituado publicista e grande estudioso das modernas correntes filosóficas. Era familiar do poeta António Aleixo e do Dr. Vítor Aleixo, que foi presidente da Câmara Municipal de Loulé.
Originário de uma família burguesa de largas posses económicas, nasceu em Loulé a 22-8-1915 e faleceu na mesma cidade a 10-08-2000, mas nos estudos, não foi além da instrução primária. Ainda jovem ficou órfão de pai, tornando-se administrador dos bens familiares. O gosto pela leitura fê-lo admirador das correntes democráticas, e não raras vezes tornava públicas as suas discordâncias políticas, denunciando as desigualdades sociais que então minavam a sociedade portuguesa. Por isso foi preso em 1943 pela PIDE, que sem julgamento o deixou encarcerado até 1945. Empregou-se em 1948 na SECIL mas para fugir à PIDE emigrou em 1953 para São Paulo, no Brasil, onde participou activamente no Movimento Portugal Democrático até 1955. Nesse ano partiu para El Tigre, na Venezuela, onde acabava de ser deposto o ditador Perez Gimenez, inscrevendo-se então na Junta Patriótica Portuguesa de Caracas. Nos anos do pós-guerra pensava-se que as autocracias e o colonialismo tinham os dias contados. Salazar e Portugal eram um dos principais alvos a abater. E quando em 1959 o capitão Henrique Galvão - um dos grandes colonialistas portugueses convertido em democrata - se refugiou na Venezuela começou a preparar uma manobra política que atraísse a atenção do mundo. Decidiu-se por uma acção de pirataria marítima e aproveitando a atracagem do navio «Santa Maria», organizou o seu assalto recrutando um grupo de vinte e um improvisados operacionais. Um deles foi precisamente Filipe Viegas Aleixo, que na noite de 21 para 22 de Janeiro de 1961 tomaram o comando do navio, numa mediática acção política que abalou a “paz podre” do salazarismo e abriu caminho à revolta armada nas colónias africanas.
Terminada a aventura do «Santa Maria» aportou no Brasil, como exilado político, mas em 1964 já está em França ao lado de Palma Inácio para tentar entrar em Portugal, mas é preso por influência da PIDE em Grenoble. Felizmente foi libertado a pedido dos movimentos democráticos que apoiavam os activistas portugueses no exílio. Mas em 1968 entrou clandestinamente em Portugal, sendo detido logo em Agosto na vila de Moncorvo e remetido para o Porto, onde viu reconfirmada a pena de prisão que lhe fora atribuída pela acção contra o «Santa Maria». Transferido para o forte de Peniche aí permaneceu até ao «25 de Abril», altura em que viu finalmente ser-lhe restituída a tão almejada liberdade, desiderato de quase uma vida dedicada à conquista dos altos valores democráticos. Voltou então para Loulé onde foi integrado nos quadros efectivos do município, dedicando-se à actividade sindical até 1985, data da sua aposentação. Em reconhecimento do seu esforço pelas liberdades individuais e colectivas foi agraciado, em 28-5-1998, pela edilidade louletana com a Medalha de Mérito Municipal Grau Prata. No ano 2000, mais precisamente em Março, e ainda na plenitude das suas faculdades intelectuais, mandou editar o livro Lições de Filosofia: dos mais variados ramos da actividade humana à luz da ciência, no qual compilou um conjunto de textos relativos aos mais diversos problemas socioculturais que afligiram a humanidade neste século. A forma desinibida e quase “naive” como interpreta os conceitos filosóficos ou como encara as ideologias modernas, conferem a este livro não só um carácter muito particular como ainda uma leitura bastante invulgar. Nesse mesmo ano de 2000, mandou também às suas expensas editar aquele que foi o seu derradeiro livro intitulado As crianças são a razão da vida e a alma do conhecimento humano, dirigido à formação moral e intelectual dos mais jovens
A sua adiantada idade e precário estado de saúde forçou o seu recolhimento a um lar de idosos onde pouco depois viria a falecer. Acima de tudo, Filipe Viegas Aleixo deve ser lembrado pelas gerações vindouras como um revolucionário anti-fascista, cuja vida de sacrifício e de permanente combate pela liberdade, dava certamente para escrever um verdadeiro romance.